quinta-feira, 18 de junho de 2009

O que está em jogo no Irão

O André já abordou brevemente a questão iraniana na sua passagem em revista da actualidade internacional, mas talvez valha a pena aprofundá-la um pouco. Na passada quinta-feira, os iranianos foram chamados às urnas para escolher o seu próximo Presidente. De acordo com os resultados oficiais, Ahmadinejad venceu com mais de 60% dos votos. O candidato da oposição, Hossein Mousavi, contestou os resultados, e desde então os seus apoiantes têm inundado as ruas de Teerão em protesto. A isso responderam as milícias fiéis ao actual Presidente com uma onda de repressão e violência que terá já causado algumas mortes.

Em boa verdade, não existem provas irrefutáveis de que os resultados eleitorais tenham sido manipulados. Porém, há indícios muito fortes que fundamentam as suspeitas e que chegam para me convencer. Aparentemente, em alguns distritos eleitorais o número de boletins de voto terá ultrapasado o de eleitores inscritos. Por outro lado, certos padrões de voto que se haviam estabelecido ao longo dos anos, e que dizem respeito à relação entre o comportamento eleitoral e a composição étnica da população, foram inesperadamente quebrados. Ahmadinejad venceu em zonas de maioria azeri – e Mousavi é azeri – que usualmente votam em candidatos da sua etnia (para uma análise aprofundada dos resultados, ver aqui).

Ora, que fazer perante este quadro? A sociedade civil internacional deverá manter-se firmemente solidária com a vontade democrática dos iranianos. A Avaaz, um exemplo de militância política global, está a recolher fundos para poder levar a cabo uma sondagem telefónica no Irão, cujos resultados, divulgados na imprensa internacional, poderão servir de instrumento de pressão. Quanto às grandes potências, parece-me que, pelo menos para já, farão bem em pautar-se por um princípio de prudência. Sarkozy comentou os episódios de violência em modo de indignação – um dos seus favoritos –, algo que, para além do protagonismo efémero que o Presidente francês nunca rejeita, pouco frutos trará. Já Obama revelou uma maior contenção nas palavras, o que não podemos deixar de considerar sensato, tendo em conta o rol de erros cometidos por anteriores administrações norte-americanas no que toca ao Irão. Expressou preocupação, mas sublinhou que não pretende imiscuir-se naquilo que é um assunto interno iraniano.

Por fim, talvez não seja descabido relativizar um pouco a importância destas eleições. Na verdade, é de duvidar que uma vitória de Mousavi trouxesse mudanças profundas nas políticas interna e externa iranianas. Por um lado, porque Mousavi só é um moderado por comparação com Ahmadinejad. Nos meus parâmetros, continua a ser um radical que defende um regime teocrático. Por outro lado, há que ter em conta que o cargo de Presidente, no quadro institucional da República Islâmica do Irão, não confere o cerne do poder político – esse pertence ao Ayatollah Ali Khamenei, o “Líder Supremo”.

Em síntese, por muito que a solidariedade internacional possa ajudar (e por muito que nos choquem as imagens da repressão), ela não pode assumir o papel central nesta disputa. Em última instância, terão de ser os iranianos a decidir o seu futuro.

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