segunda-feira, 27 de julho de 2009

Programa para a Internacionalização das Ciências Sociais

A Fundação Calouste Gulbenkian lançou um novo programa para a internacionalização das Ciências Sociais, com o objectivo de incentivar a publicação em revistas internacionais de referência.
Todos os investigadores portugueses e estrangeiros, que trabalhem em instituições portuguesas e que tenham idade inferior a 40 anos em 30 de Setembro de 2009 (data limite do concurso) podem participar. Serão admitidos neste concurso artigos publicados, ou aceites para a publicação, em revistas internacionais de referência entre os anos de 2006 e 2008.
A candidatura deverá ser submitida online em www.gulbenkian.pt
Um Júri nomeado para o efeito atribuirá duas distinções no valor de 5.000 € cada.
Para mais informações, por favor, consulte o regulamento do concurso em http://www.gulbenkian.pt/media/files/fundacao/ciencia/Regulamento-Programa_para_a_Internacionalizacao_das_Ciencias_Sociais.pdf

PEPAL - Programa de Estágios Profissionais na Administração Local

Informa-se que, dentro em breve, dará início mais um programa de estágios profissionais na Administração Pública. Só se saberá o número de vagas em fins de Julho - e, por essa razão, o site ainda se encontra desactualizado - mas todos os estágios deverão dar início até Outubro de 2009.

Os estágios profissionais organizados no âmbito do PEPAL destinam-se a jovens com idade compreendida entre os 18 e os 30 anos (à data da apresentação da candidatura), possuidores de licenciatura ou bacharelato (níveis de qualificação V e IV) ou habilitados com curso de qualificação profissional (nível III), recém-saídos dos sistemas de educação e formação à procura do primeiro emprego ou desempregados à procura de novo emprego que não tenham frequentado o PEPAP - Programa de Estágios Profissionais na Administração Pública Central.
Têm prioridade no acesso ao PEPAL os jovens à procura de emprego que, nessa qualidade, se encontrem inscritos há mais de três meses nos centros de emprego, sendo da responsabilidade do candidato informar a entidade onde se realiza o estágio da prioridade.

Para mais informações, por favor, consulte o site http://www.pepal.gov.pt/pepal/
Relembro que este não se encontra actualizado, devendo tal acontecer no princípio de Agosto.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

O grande desafio de Obama

Depois de uma vitória eleitoral histórica em Novembro passado, e que significou também o regresso em força do poder da palavra à política, Barack Obama começa agora a enfrentar os desafios mais sérios ao seu programa de mudança.


Nos corredores de Washington, discute-se actualmente a reforma – fundamental, nas palavras de Obama – do sistema de saúde norte-americano. E porque, apesar de tudo, a prática da mudança é bem mais difícil do que o discurso, Obama não poderá contar apenas com a sua capacidade de persuasão e com a pressão de uma opinião pública que, pelo menos para já, lhe é favorável. A reforma proposta pela administração Obama não enfrenta apenas a oposição republicana, mas também a de certos sectores do seu próprio partido, pelo que se prevêem negociações ferocíssimas em ambas as frentes. Inevitavelmente, creio, Obama terá de ceder em alguns pontos do seu plano de reforma, o que, por seu turno, desagradará à ala esquerda dos democratas.


O resultado é, pois, incerto, mas uma coisa é certa: a retórica de mudança de Obama, afinal, não era só retórica. E um eventual triunfo de uma reforma que institua um sistema de saúde público, de cobertura universal, nos EUA só não será aproveitado como impulso positivo pela social-democracia europeia, se esta continuar presa a lideranças incapazes.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Paradoxos da (pós-)modernidade

"Hoje, sentimos como uma ameaça para a cultura aqueles que têm uma relação imediata e viva com a sua própria cultura, sem qualquer distanciamento em relação a ela. Lembremo-nos da indignação pública quando, há três anos, os talibãs do Afeganistão dinamitaram as antigas estátuas de Buda em Bamiyan: apesar de nenhum de nós, ocidentais esclarecidos, acreditar na divindade de Buda, sentimo-nos indignados pelo facto de os muçulmanos talibãs não terem mostrado nenhum respeito pelo «património cultural» do seu próprio país e de toda a humanidade. Em vez de crerem através dos outros, como todas as pessoas cultas, foi-nos dada a prova de que estavam completamente imersos na crença da sua própria religião e que, consequentemente, não mostravam grande sensibilidade pelo valor cultural dos monumentos das outras religiões – para eles, as estátuas de Buda não eram mais do que falsos ídolos e não «tesouros culturais»"

Slavoj
Žižek, A Marioneta e o Anão (Relógio de Água, 2006)

terça-feira, 14 de julho de 2009

Irão - documentário

Hoje deixo a sugestão de um documentário que encontrei neste blogue.
"Era uma vez no Irão - peregrinação a Kabala" parece-me um documentário de grande interesse, com a duração de pouco mais de uma hora.
Uma boa sugestão para aproveitar num descanso das férias.

domingo, 12 de julho de 2009

Revista "Perspectiva: Reflexões sobre a Temática Internacional"

A todos os interessados, aqui fica a proposta da Revista "Perspectiva", uma revista brasileira que publica textos de jovens investigadores na área das Relações Internacionais - lamento que venha muito em cima da hora, mas só agora tive acesso a ele. Devemos estar atentos nos próximos números!
Por impossibilidade de a anexar, deixo as informações mais pertinentes, transmitidas pelo cartaz da dita revista.


"O Centro Estudantil de Relacões Internacionais (CERI/UFRGS), em parceria com a Pró-Reitoria de Graduação, anuncia o lançamento do 2.º número (2009/I) da revista de iniciação científica do curso de relações internacionais e o início do período para submissão de artigos para o próximo número.
O Conselho Executivo da revista: Perspectiva: Reflexões sobre a temática internacional convida graduandos de todos os cursos e instituições do país a submeter artigos científicos da sua autoria para a nova edição (2009/II). A avaliação desses artigos ficará sob responsabilidade exclusiva do Conselho Editorial da revista.


Perspectiva se propõe para o diálogo entre diferentes áreas do conhecimento, reconhecendo nas Relações Internacionais um campo interdisciplinar e plural. Deste modo, artigos de estudantes de cursos como o de Ciências Políticas e Sociais, Economia, Direito, História e afins - que abordem temas relacionados às relações itnernacionais - só tendem a enriquecer a revista como um todo.
Prazo para submissão de artigos: 20 de Junho até 15 de Julho de 2009.

Normas para publicação e esclarecimentos gerais: revistaperspectiva@hotmail.com


Submissão online de artigos: perspectiva_submissao@hotmail.com "


Aproveitem e boa sorte!

sábado, 11 de julho de 2009

Cimeiras do G8 cada vez mais criticadas

No âmbito da Cimeira em L´Alquila surgem graves críticas, acusando o insucesso desta última Cimeira e apontando para a incapacidade de um governo mundial, fugindo continuamente ao confronto com promessas não cumpridas – “Die drei Tage von L’Aquila waren eine einzige Pleite – mit einer Weltregierung hat das G-8-Treffen nichts zu tun.” (Moritz Döbler (2009), “Der Letzte Gipfel”. ZEIT Online, 11 de Julho de 2009)




Leiam este artigo, está muito bem escrito...

"Vielleicht ist das alles nicht so wichtig. Aber wenn es jetzt wirklich darum geht, die Welt aus einer historischen Wirtschaftskrise zu führen und vor einer Klimakatastrophe zu retten, waren die drei Tage von L’Aquila eine einzige Pleite. Mit einer Weltregierung hatte das jedenfalls nichts zu tun. Silvio Berlusconi hat es verstanden, die Führer der wichtigsten Industrie- und Schwellenländer zu Statisten einer Inszenierung zu machen, die von seinen Poolpartys ablenkt und politische Potenz suggeriert.
Der Welt hatte der G-8-Gipfel nichts zu bieten. Die Beschlüsse zum Klimawandel sind eine Kapitulation, sonst nichts. Was würde man denn einem Alkoholiker sagen, der freudig ankündigt, er werde spätestens in 41 Jahren trocken sein – und dabei eine Flasche Schnaps leert? Nicht viel anders hielten es aber die acht wichtigsten Industriestaaten in L’Aquila. Bis zum Jahr 2050 wollen sie erreichen, dass der Ausstoß von Kohlendioxid weltweit halbiert wird, und sie selbst wollen sogar 80 Prozent schaffen. Aber von mittel- oder gar kurzfristigen Zielen haben sie sich verabschiedet. Und das langfristige Ziel wird nicht mal von allen geteilt.

Ein anderes Beispiel für das Versagen der G 8 ist die Hilfe für Afrika. Vor vier Jahren haben sie beim Gipfel von Gleneagles versprochen, die Hilfe für den ärmsten Kontinent bis zum Jahr 2010 auf jährlich 50 Milliarden Dollar zu verdoppeln. In L’Aquila haben sie diesen Beschluss bekräftigt, obwohl die meisten von ihnen bisher nicht annähernd in die Nähe der erforderlichen Beträge gekommen sind. Hinzu kommt, dass die schlichte Wiederholung des Zieles in Wahrheit eine massive Kürzung ist: Der Dollar hat gegenüber dem Euro seit Gleneagles ein Siebtel seines Werts verloren. So leidet Afrika unter der globalen Wirtschaftskrise in doppelter Hinsicht, direkt und indirekt.
Dafür haben die G 8 nun ein neues Ziel: Ein Hilfsprogramm soll in den kommenden drei Jahren Bauern in armen Ländern mit 20 Milliarden Dollar helfen. Dagegen ist nichts zu sagen. Nur könnte einem vielleicht auffallen, dass die US-Regierung allein zur Rettung eines einzigen Unternehmens – General Motors – das Dreifache dieser Summe mobilisiert. Oder dass all die Hilfe überflüssig wäre, wenn sich die Welt endlich, endlich auf ein Handelsabkommen einigte. In L’Aquila wurde wieder einmal die gute Absicht formuliert; bisher scheiterte sie stets an vielfältigen nationalen Interessen.
L’Aquila war vermutlich das letzte Treffen der G 8, das wenigstens den Anspruch hatte, ein Gipfel zu sein, nicht nur protokollarisch, sondern auch inhaltlich. Angela Merkel hat deutlich gemacht, dass sie G-8-Gipfel künftig als Vorbesprechungen betrachtet. Ein Format, das 1975 so schön als informeller Weltwirtschaftsgipfel am Kamin von Schloss Rambouillet begann, hat sich überholt. Eine Ironie am Rande ist, dass ausgerechnet die prekäre Lage der Weltwirtschaft in L’Aquila nahezu ausgeklammert wurde.
Aber das neue, größere Format G 20, das die Schwellenländer aufnimmt, kann nichts besser. Nach den zwei ersten Weltfinanzgipfeln in Washington und London gibt es einen Haufen von Absichtserklärungen, aber nicht viel mehr. Die G 20 haben keine Legitimation und keinen Vorsitzenden – man kann ihnen nicht mal einen Brief schreiben. So muss man den nächsten Gipfel im September in Pittsburgh wohl mit Skepsis sehen. Mag sein, dass alles gut wird. Aber wahrscheinlich geht an den Vereinten Nationen und der Europäischen Union, so schwerfällig sie sein mögen, kein Weg vorbei. Vermeintliche Abkürzungen kosten häufig nur Zeit.” (Moritz Döbler (2009), “Der Letzte Gipfel”. ZEIT Online, 11 de Julho de 2009)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Xinjiang: um outro Tibete

Ao contrário do que os menos atentos possam pensar, o Tibete não é o único foco de tensão étnica na China. A recente explosão de violência na província de Xinjiang, no extremo Noroeste do território chinês, veio provar isso mesmo.

Saber o que se está a passar, ao certo, em Xinjiang é muito difícil, tendo em conta a ausência de liberdade de imprensa na China. Em todo o caso, o quadro geral é suficientemente claro: trata-se do exacerbar de tensões de longa data entre a maioria uigure, de ascendência turcomena, e os chineses de etnia han. São as consequências expectáveis de um processo de construção do estado-nação conduzido com punho de ferro, primeiro pela República do Kuomintang e depois pela brutalidade de Mao.

A situação é, pois, comparável à do Tibete, mas talvez encerre em si um potencial de conflito superior. Por um lado, porque a província de Xinjiang, mais extensa e populosa que o Tibete, apresenta uma maior diversidade étnica. Por outro lado, ao contrário do Tibete, trata-se de uma região rica em recursos naturais (mineração, gás natural e produção agrícola) e de elevada importância estratégica, como via de acesso da China à Ásia Central.

E enfim, não nos podemos esquecer que o pano de fundo desta violência étnica é a crise económica global e os seus efeitos no crescimento chinês. Não é de estranhar que, conforme foi noticiado, os tumultos tenham sido despoletados pela forma como o governo chinês lidou com uma disputa entre trabalhadores uigures e trabalhadores han numa fábrica no Sul do país.

Que a única contestação visível à ditadura chinesa provenha deste tipo de impulsos identitários é algo que, enquanto democrata, me deixa consternado. Isso, contudo, é já uma outra questão.

Saddam Hussein

Para os interessados na questão do Iraque e em pormenores da guerra de Bush, foram divulgadas entrevistas do ex-ditador iraquiano ao FBI que constituem uma boa base de estudo e de aprofundamento da questão.





Porque nem sempre tudo o que parece é...


quarta-feira, 8 de julho de 2009

Os 8 com as mãos na massa...


... atentos ao resultado de tal receita...

Actualidade Internacional

1. Obama continua a sua visita pela Rússia. Várias são as notícias que relatam pormenores do encontro diplomático – o primeiro de Obama no país de Putin e de Medvev. Esta aproximação, que, por exemplo, já resultou num acordo de redução dos arsenais nucleares dos dois países e na retoma das actividades militares em comum suspensas desde a situação na Geórgia, é vista pelos media russos com grande cepticismo: ressaltam as divergências dos dois países, questionam o que esconderão os sorrisos e os apertos de mão e as intenções americanas: "Pode um leopardo mudar suas manchas? O curso estratégico americano permanece intacto, independente de quem ocupa a cadeira do presidente" (popular diário russo, o Moskovsky Komsomolets) As rádios emitem as declaração de Medvev e evitam as de Obama e, para terminar, uma manchete de tablóide afirma mesmo que Obama foi atropelado por ceifadeiras, uma vez que Putin, no primeiro dia do presidente americano em Moscovo, andava pelo sul do país em fábricas de ceifadeiras. Não obstante, Barack Obama incita a aproximação dos dois países, enfatizando os seus interesses comuns e a necessidade de se ultrapassar as desconfianças da Guerra Fria e passar para uma verdadeira parceria global que dê aos dois países o seu lugar no contexto internacional. A nova diplomacia americana em acção.

2. O Papa, na sua encíclica social hoje apresentada, defendeu a criação de uma autoridade política mundial, de forma a enfrentar os problemas globais com estruturas e soluções também elas globais. Há uma valorização da cooperação internacional, num contexto de crise, que poderá ser a sua solução, como temos vindo a observar. O Sumo Pontífice adianta ainda que seria desejável o desarmamento integral dos países, a garantia da segurança alimentar e da protecção do ambiente. Questiono-me sobre as suas intenções e a concretização da sua ideia de “regulação dos fluxos migratórios”. Um bom tema para quem quiser dedicar-se às 150 páginas da Encíclica de Bento XVI.

3. No seu primeiro discurso oficial, Ahmadinejad, o “novo” Presidente da República Islâmica do Irão, congratula o país pelas eleições mais livres do mundo. Uma afirmação no mínimo irónica depois de todos os acontecimentos que têm marcado o país desde o acto eleitoral. Repare-se que os confrontos têm-se dado de forma menos intensa graças ao reforço da intervenção policial, que, aliás, encerrou duas universidades para evitar manifestações lá programadas.
O líder iraniano garante, no entanto, que o país entrará numa nova fase, marcada por uma especial atenção ao emprego e à economia – áreas em que Ahmadinejad foi fortemente criticado pela oposição.

4. O Presidente da Costa Rica vai servir como mediador na crise política das Honduras. Tanto Zelaya como Micheletti concordaram com a sugestão de Clinton – na verdade, os EUA garante que pretendem o restabelecimento da paz e democracia no país. Dps tentativa zelaya voltar. Apesar da OEA ter já condenado o golpe de estado e de ter suspenso a participação das Honduras na organização, o Presidente interino não cede e impediu, através das suas Forças Armadas que Zelaya aterrasse no país.
Repare-se que Zelaya é aliado da facção esquerdista de Chávez e, por isso mesmo, os EUA dizem apoiá-lo não pela sua personalidade, mas pela sua democrática eleição e justa representação, como explica a Secretária de Estado, Hillary Clinton.

5. O governo iraquiano baniu todas as visitas organizadas ao túmulo de Saddam Hussein, depois de se aperceber que o local era um ponto de encontro de leais ao condenado líder e que várias escolas organizavam excursões com alunos para visitar o mausoléu do ex-ditador iraquiano.

6. A confusão continua na China. Dois dias depois das manifestações que originaram mais de 150 mortos e 1000 feridos, consideradas já as mais sangrentas de teor étnico na China em décadas, e apesar da presença de milhares de soldados e da polícia na região, o Governo parece incapaz de manter a calma e aliviar as graves tensões. Como resposta aos incidentes, os chineses marcharam pela cidade de Urumqi a cantar o hino e a pedir vingança. Note-se que na região de Xinjiang vivem cerca de 20 milhões de habitantes, que representam 47 grupos étnicos minoritários, sendo que o maior deles, os Uighurs, responsáveis pelos desacatos, conta com uma população de mais de 8 milhões de pessoas. Este povo islâmico da Ásia Central é apontado pelos conterrâneos chineses de estarem ligados, pelas suas intenções separatistas, ao grupo Al-Qaeda. Os especialistas são peremptórios ao afirmar que essas ligação não devem existir e, a existir, seriam muito ténues e sem força para provocar tais desordens. As organizções dos Direitos Humanos criticam a repressão brutal do Governo; os EUA apelam à calma das partes; os interessados por todo o mundo mantêm os olhos postos na China e neste barril de pólvora.

7. A reunião do G8 sobre o ambiente promete. Os EUA estão com uma nova política em relação às responsabilidades ambientais e prometem agir. Os europeus estão contentes com a mudança, como declarou Merkel, mas lamentam que os americanos talvez não estejam muito interessados em limitações de emissões rígidas e numericamente definidas. O mundo acompanhará o G8 em Itália.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A ler

O artigo foi escrito por Miguel Sousa Tavares em 29 de Junho de 2009, e vale mesmo a pena ler.

Esta noite sonhei com Mário Lino por Miguel Sousa Tavares in Expresso

Segunda-feira passada, a meio da tarde, faço a A-6, em direcção a Espanha e na companhia de uma amiga estrangeira; quarta-feira de manhã, refaço o mesmo percurso, em sentido inverso, rumo a Lisboa. Tanto para lá como para cá, é uma auto-estrada luxuosa e fantasma. Em contrapartida, numa breve incursão pela estrada nacional, entre Arraiolos e Borba, vamos encontrar um trânsito cerrado, composto esmagadoramente por camiões de mercadorias espanhóis. Vinda de um país onde as auto-estradas estão sempre cheias, ela está espantada com o que vê:

- É sempre assim, esta auto-estrada?

- Assim, como?

- Deserta, magnífica, sem trânsito?

- É, é sempre assim.

- Todos os dias?

- Todos, menos ao domingo, que sempre tem mais gente.


- Mas, se não há trânsito, porque a fizeram?


- Porque havia dinheiro para gastar dos Fundos Europeus, e porque diziam que o desenvolvimento era isto.

- E têm mais auto-estradas destas?

- Várias e ainda temos outras em construção: só de Lisboa para o Porto, vamos ficar com três. Entre S. Paulo e o Rio de Janeiro, por exemplo, não há nenhuma: só uns quilómetros à saída de S. Paulo e outros à chegada ao Rio. Nós vamos ter três entre o Porto e Lisboa: é a aposta no automóvel, na poupança de energia, nos acordos de Quioto, etc. - respondi, rindo-me.

- E, já agora, porque é que a auto-estrada está deserta e a estrada nacional está cheia de camiões?

- Porque assim não pagam portagem.

- E porque são quase todos espanhóis?

- Vêm trazer-nos comida.

- Mas vocês não têm agricultura?

- Não: a Europa paga-nos para não ter. E os nossos agricultores dizem que produzir não é rentável.

- Mas para os espanhóis é?

- Pelos vistos...

Ela ficou a pensar um pouco e voltou à carga:

- Mas porque não investem antes no comboio?

- Investimos, mas não resultou.

- Não resultou, como?

- Houve aí uns experts que gastaram uma fortuna a modernizar a linha Lisboa-Porto, com comboios pendulares e tudo, mas não resultou.

- Mas porquê?

- Olha, é assim: a maior parte do tempo, o comboio não 'pendula'; e, quando 'pendula', enjoa de morte. Não há sinal de telemóvel nem Internet, não há restaurante, há apenas um bar infecto e, de facto, o único sinal de 'modernidade' foi proibirem de fumar em qualquer espaço do comboio. Por isso, as pessoas preferem ir de carro e a companhia ferroviária do Estado perde centenas de milhões todos os anos.

- E gastaram nisso uma fortuna?

- Gastámos. E a única coisa que se conseguiu foi tirar 25 minutos às três horas e meia que demorava a viagem há cinquenta anos...

- Estás a brincar comigo!

- Não, estou a falar a sério!

- E o que fizeram a esses incompetentes?

- Nada. Ou melhor, agora vão dar-lhes uma nova oportunidade, que é encherem o país de TGV: Porto-Lisboa, Porto-Vigo, Madrid-Lisboa... e ainda há umas ameaças de fazerem outro no Algarve e outro no Centro.

- Mas que tamanho tem Portugal, de cima a baixo?

- Do ponto mais a norte ao ponto mais a sul, 561 km.

Ela ficou a olhar para mim, sem saber se era para acreditar ou não.

- Mas, ao menos, o TGV vai directo de Lisboa ao Porto?

- Não, pára em várias estações: de cima para baixo e se a memória não me falha, pára em Aveiro, para os compensar por não arrancarmos já com o TGV deles para Salamanca; depois, pára em Coimbra para não ofender o prof. Vital Moreira, que é muito importante lá; a seguir, pára numa aldeia chamada Ota, para os compensar por não terem feito lá o novo aeroporto de Lisboa; depois, pára em Alcochete, a sul de Lisboa, onde ficará o futuro aeroporto; e, finalmente, pára em Lisboa, em duas estações.

- Como: então o TGV vem do Norte, ultrapassa Lisboa pelo sul, e depois volta para trás e entra em Lisboa?

- Isso mesmo.

- E como entra em Lisboa?

- Por uma nova ponte que vão fazer.

- Uma ponte ferroviária?

- E rodoviária também: vai trazer mais uns vinte ou trinta mil carros todos os dias para Lisboa.

- Mas isso é o caos, Lisboa já está congestionada de carros!

- Pois é.

- E, então?

- Então, nada. São os especialistas que decidiram assim.

Ela ficou pensativa outra vez. Manifestamente, o assunto estava a fasciná-la.

- E, desculpa lá, esse TGV para Madrid vai ter passageiros? Se a auto-estrada está deserta...

- Não, não vai ter.

- Não vai? Então, vai ser uma ruína!

- Não, é preciso distinguir: para as empresas que o vão construir e para os bancos que o vão capitalizar, vai ser um negócio fantástico! A exploração é que vai ser uma ruína - aliás, já admitida pelo Governo - porque, de facto, nem os especialistas conseguem encontrar passageiros que cheguem para o justificar.

- E quem paga os prejuízos da exploração: as empresas construtoras?

- Naaaão! Quem paga são os contribuintes! Aqui a regra é essa!

- E vocês não despedem o Governo?

- Talvez, mas não serve de muito: quem assinou os acordos para o TGV com Espanha foi a oposição, quando era governo...

- Que país o vosso! Mas qual é o argumento dos governos para fazerem um TGV que já sabem que vai perder dinheiro?

- Dizem que não podemos ficar fora da Rede Europeia de Alta Velocidade.

- O que é isso? Ir em TGV de Lisboa a Helsínquia?

- A Helsínquia, não, porque os países escandinavos não têm TGV.

- Como? Então, os países mais evoluídos da Europa não têm TGV e vocês têm de ter?

- É, dizem que assim entramos mais depressa na modernidade.

Fizemos mais uns quilómetros de deserto rodoviário de luxo, até que ela pareceu lembrar-se de qualquer coisa que tinha ficado para trás:

- E esse novo aeroporto de que falaste, é o quê?

- O novo aeroporto internacional de Lisboa, do lado de lá do rio e a uns 50 quilómetros de Lisboa.
- Mas vocês vão fechar este aeroporto que é um luxo, quase no centro da cidade, e fazer um novo?


- É isso mesmo. Dizem que este está saturado.

- Não me pareceu nada...

- Porque não está: cada vez tem menos voos e só este ano a TAP vai cancelar cerca de 20.000. O que está a crescer são os voos das low-cost, que, aliás, estão a liquidar a TAP.

- Mas, então, porque não fazem como se faz em todo o lado, que é deixar as companhias de linha no aeroporto principal e chutar as low-cost para um pequeno aeroporto de periferia? Não têm nenhum disponível?

- Temos vários. Mas os especialistas dizem que o novo aeroporto vai ser um hub ibérico, fazendo a trasfega de todos os voos da América do Sul para a Europa: um sucesso garantido.

- E tu acreditas nisso?

- Eu acredito em tudo e não acredito em nada. Olha ali ao fundo: sabes o que é aquilo?

- Um lago enorme! Extraordinário!


- Não: é a barragem de Alqueva, a maior da Europa.

- Ena! Deve produzir energia para meio país!

- Praticamente zero.

- A sério? Mas, ao menos, não vos faltará água para beber!

- A água não é potável: já vem contaminada de Espanha.

- Já não sei se estás a gozar comigo ou não, mas, se não serve para beber, serve para regar - ou nem isso?

- Servir, serve, mas vai demorar vinte ou mais anos até instalarem o perímetro de rega, porque, como te disse, aqui acredita-se que a agricultura não tem futuro: antes, porque não havia água; agora, porque há água a mais.

- Estás a dizer-me que fizeram a maior barragem da Europa e não serve para nada?

- Vai servir para regar campos de golfe e urbanizações turísticas, que é o que nós fazemos mais e melhor.

Apesar do sol de frente, impiedoso, ela tirou os óculos escuros e virou-se para me olhar bem de frente:

- Desculpa lá a última pergunta: vocês são doidos ou são ricos?

- Antes, éramos só doidos e fizemos algumas coisas notáveis por esse mundo fora; depois, disseram-nos que afinal éramos ricos e desatámos a fazer todas as asneiras possíveis cá dentro; em breve, voltaremos a ser pobres e enlouqueceremos de vez.

Ela voltou a colocar os óculos de sol e a recostar-se para trás no assento. E suspirou:

- Bem, uma coisa posso dizer: há poucos países tão agradáveis para viajar como Portugal! Olha-me só para esta auto-estrada sem ninguém!

Individualismo – entre agência e contingência II

A rejeição do individualismo (neo)liberal não implica a rejeição do princípio individualista – até porque as alternativas que se lhe conhecem (o primado da raça, da nação, da classe, etc.) são tudo menos prometedoras. Implica, sim, a sua reformulação, para que possa abarcar a complexidade das relações entre indivíduo e sociedade.

O cerne da questão reside na autonomia do social, não redutível à soma dos indivíduos e das suas escolhas. E esse corpo autónomo que é a sociedade, governado por dinâmicas próprias, afecta os destinos individuais, colocando limites ao livre-arbítrio. Porém, afecta-os, e logo desde o início, de forma desigual – há quem seja favorecido e quem seja prejudicado pela circunstância social em que a sorte (ou o azar) ditou que nascesse. Aqui, como é evidente, não tem cabimento apelar para qualquer noção de mérito. Ninguém tem o mérito de ter nascido numa família rica ou o demérito de ter nascido num meio pobre. Assim sendo, qual é o grau de desigualdade à partida aceitável? Por outras palavras, quais são os princípios da justiça social? A meu ver, a resposta mais satisfatória a esta questão foi dada por John Rawls, na sua incontornável “Theory of Justice”.

O que Rawls propõe para chegarmos aos princípios da justiça social é uma experiência intelectual, uma situação hipotética. Imaginemos que os indivíduos que compõem uma dada sociedade se reúnem para estabelecer os princípios de justiça que deviam subjazer às principais instituições sociais (sistema político, organização económica, etc.). Assumindo a racionalidade, em sentido estrito, dos indivíduos, seria de esperar que cada um escolhesse os princípios que mais favorecessem a sua posição social. Ora, acontece que, na posição original proposta por Rawls, ninguém sabe o lugar que ocupa na sociedade, em termos de classe ou status, nem os recursos com que a natureza o dotou (inteligência, força, etc.). Assume-se mesmo que os indivíduos não conhecem as suas concepções do bem e as suas propensões psicológicas. A escolha faz-se, pois, sob um véu de ignorância.

Segundo Rawls, «this ensures that no one is advantaged or disadvantaged in the choice of principles by the outcome of natural chance or the contingency of social circumstances. Since all are similarly situated and no one is able to design principles to favor his particular condition, the principles of justice are the result of a fair agreement or bargain.» Desta forma, elimina-se o peso das condições particulares sobre a decisão, assegurando a universalidade dos princípios escolhidos.

Quais são, então, os princípios que os indivíduos colocados na posição original sob o véu de ignorância escolheriam? Rawls acredita serem dois:
«First: each person is to have an equal right to the most extensive basic liberty compatible with a similar liberty for others.
Second: social and economic inequalities are to be arranged so that they are both (a) reasonably expected to be to everyone’s advantage, and (b) attached to positions and offices open to all.»

O primeiro princípio não é mais do que a clássica defesa das liberdades formais individuais. A grande inovação do pensamento de Rawls reside no segundo, na ideia de que é possível e necessário avaliar a justiça das desigualdades materiais efectivas. Os conceitos indeterminados do segundo princípio (o que significa «everyone’s advantage»?) mereceriam uma análise mais profunda. Mas, o que me importa sublinhar aqui é que os horizontes do individualismo não se esgotam num pensamento solipsista que endeusa a agência individual e ignora ou desvaloriza a contingência social. O individualismo de John Rawls funda-se numa síntese bem mais frutuosa entre agência e contingência, permitindo-nos, sem abdicar da perspectiva individualista, conceber uma justiça social.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Democracia

"It's not the voting that's democracy, it's the counting. "
Tom Stoppard

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Irão - a saga continua

A oposição a Ahmadinejad continua relativamente firme, apesar de algumas semanas terem já passado desde as polémicas eleições de 12 de Junho – intransigentes continua o Governo e o Conselho dos Guardiães, que não abrem mão do resultado, assim como Mousavi e a sua claque também não abrem mão dos protestos e insistem em chamar a atenção da comunidade internacional, apesar das tentativas do governo de controlar a situação – censura, proibição de entrada de meios de comunicação estrangeiros, repressões violentas e, mais recentemente, a acusação de ingerência das potências ocidentais neste assunto interno do Irão.


Efectivamente, Neda tornou-se um símbolo: um símbolo que a oposição usa para incarnar a sua luta contra a alegada injusta eleição do já Presidente iraniano, mas, simultaneamente, a jovem estudante de Filosofia (cuja idade varia entre os 16 e os 27 anos, como diferem as fontes) tornou-se no exemplo que as autoridades oficiais agora usam para comprovar a presença de forças estrangeiras no país: Ahmadinejad exige que se apurem responsabilidades, testemunhas (hesitei em pôr o termo entre aspas, mas ficam aqui as minhas reticências) garantem que não havia forças policiais no local do crime, supostos relatórios explicam que as balas não são as usadas pela polícia iraniana,… Ou seja, quer isto dizer que alguém de fora esteve implicado: a CIA aparece em primeiro lugar; a Grã-Bretanha vem em segundo. O Embaixador do Irão no México acusa a CIA de estar envolvida e Ahmadinejad garante:
"The massive propaganda of the foreign media, as well as other evidence, proves the interference of the enemies of the Iranian nation who want to take political advantage and darken the pure face of the Islamic republic”

As tensões diplomáticas vão crescendo no entretanto. Elementos da Embaixada inglesa no Irão são detidos, porque acusados de envolvimentos nos distúrbios, e Brown não se conforma com tal exagero iraniano, que considera inaceitável e injustificável, como o próprio adjectiva.

As razões apresentadas pelo ministro iraniano Gholam-Hosein Mohseni Ejei são, no mínimo, discutíveis: “The fact that Iran is stable, calm and secure, they're upset with this,". O facto é que os europeus, cuja “total solidariedade” foi reconhecida pelo Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, olham com desconfiança para a política ofensiva de Teerão. Este desapontamento de que falam vários Ministros dos Negócios Estrangeiros (MNE) culminou, muito recentemente, com o fim das conversações que a UE desenvolvia com o Irão para que este abandonasse as suas pretensões nucleares há já alguns anos, por imposição deste último. Ahmadinejad soube, de forma magistral, utilizar esta desconfiança de ingerência para terminar com estas incómodas conversações que queriam limitar as suas actividades nucleares (mesmo apesar da inflexibilidade que o Irão tinha vindo a mostrar).

Agora, os MNE da UE ponderam a retirada dos seus representantes diplomáticos do país. Custa-me a crer que tal venha a concretizar-se, mas a verdade é que, usando esta situação a seu favor, Ahmadinejad está a conseguir consolidar o seu poder e a vincar a sua posição no contexto internacional, mesmo que optando por esta escalada da tensão diplomática e pelo isolacionismo. Aguardemos.